Rio+20 e o setor automotivo

Empresas da indústria automobilística levaram soluções para a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável – mas será que apenas mudar a fonte energética dos automóveis é suficiente para um futuro com menos poluição?

Fernando Lalli

Milhares de representantes de governos, indústrias e entidades sociais de todo o mundo se reuniram na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que aconteceu entre os dias 13 e 22 de junho no Rio de Janeiro/RJ. A Rio +20 se prestou a debater sobre como o modo de vida e produção humano pode ser orientado para que o meio ambiente seja preservado. O documento final produzido pela Conferência procurou delinear meios e metas visando dois objetivos principais: como criar uma economia verde para alcançar o desenvolvimento sustentável e tirar as pessoas da pobreza; e como melhorar a coordenação internacional para o desenvolvimento sustentável.

Debaixo do “guarda-chuva” desses objetivos, vários tópicos foram apresentados em diversos eventos, tanto dentro quanto fora da programação oficial da Rio+20. Um dos tópicos tem influência direta no mercado automobilístico: mobilidade sustentável. Basicamente, discutiram-se alternativas aos combustíveis fósseis e novas maneiras de se pensar o trânsito urbano, e algumas montadoras se envolveram diretamente com a Conferência para mostrar suas visões e propostas para um futuro em que o automóvel e o transporte público sejam menos agressivos ao meio ambiente.

A possibilidade do carro elétrico e/ou híbrido é a solução mais próxima que a indústria oferece, atualmente, como alternativa para reduzir a emissão de poluentes na atmosfera. Volkswagen, BMW e o Grupo Renault/Nissan demonstraram isso ao levarem para a Conferência suas propostas de modelos movidos à eletricidade – sendo que alguns já são realidade nas ruas, pelo menos no exterior.

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Nissan LEAF e Renault Fluence Z.E.

O Grupo Renault/Nissan forneceu três modelos 100% elétricos para a frota da Rio+20: o Renault Fluence Z.E., Renault Kangoo Z.E. e o Nissan LEAF, todos já vendidos regularmente na Europa. Estes, mais o Renault Twizy Z.E. (um veículo de dois lugares para uso urbano), estiveram expostos na Conferência. A sigla Z.E. (zero emission) identifica os modelos elétricos da Renault, enquanto o LEAF é o modelo totalmente elétrico mais vendido da história, segundo a Nissan, com 32 mil unidades vendidas na América do Norte, Europa e Japão. O Grupo também promoveu test-drives dos carros durante o evento.

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BMW Concept ActiveE (acima) e Mini E (abaixo)
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Já o estande de 400 m² da BMW, montado no Parque dos Atletas, serviu de palco para palestras sobre a submarca “BMW i”, responsável pelos carros elétricos e híbridos da montadora. A BMW trouxe diretamente da Alemanha 5 modelos para test-drive no Autódromo de Jacarepaguá. Entre eles, os modelos BMW Concept ActiveE e o Mini E, desenvolvidos com tecnologias que, de acordo com a marca, serviram de referências e base para o desenvolvimento futuro de modelos elétricos da sub marca BMW i, como os i3 e i8.

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BMW 1602, de 1972, com motor elétrico

Um dos carros elétricos expostos é histórico para a BMW: o sedã 1602 adaptado com baterias para escoltar a maratona das Olimpíadas de 1972, em Munique. O modelo percorreu os 42 Km da prova acompanhando os atletas sem problemas, isso com uma tecnologia desenvolvida há 40 anos.

A Volkswagen trouxe de sua matriz o protótipo e-Bulli, uma releitura moderna da clássica Kombi (chamada de “Bulli” na Alemanha). Segundo a VW, o motor elétrico do e-Bulli é alimentado com energia de uma bateria de íon de lítio; produz 85 kW de potência, 27,5 kgfm de torque máximo e possui uma autonomia de até 300 km. Em estações de reabastecimento elétrico especialmente projetadas para veículos elétricos, a montadora afirma que o processo de carregamento leva menos de uma hora.

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VW e-Bulli

A Volks também levou para a Rio+20 a tecnologia BlueMotion aplicada no Fox e no Polo. Os modelos tiveram diversas modificações para reduzir o consumo de combustíveis e emissões, entre elas, design alterado para melhorar a aerodinâmica; pneus “verdes”, que oferecem menor resistência ao rolamento, dispositivos de assistência à economia de combustível no painel, entre outros.

Diesel também é alternativa
O Grupo PSA Peugeot Citroën aproveitou a Rio+20 para apresentar em primeira mão os Peugeot 3008 e Citroën DS5 com a tecnologia HYbrid4, sistema híbrido que alia motor a diesel e elétrico. De acordo com a empresa, os veículos estão rodando abastecidos com biodiesel B30 (composto por 30% de biodiesel e 70% de diesel comum), e são parte do Projeto Biodiesel Brasil, uma parceria entre a PSA e o Ladetel (Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas), da Universidade de São Paulo. O projeto está em sua terceira fase e também vai testar a viabilidade de uso do biodiesel B100 em modelos de passeio. De acordo com a PSA, serão investidos R$ 1,5 milhão no projeto até 2013.

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Peugeot 3008 e Citroën DS5 com a tecnologia HYbrid4

Os resultados divulgados apontam que os veículos chegam a apresentar emissões de 75g de CO2/km rodando com o biodiesel brasileiro, enquanto o carro brasileiro com o nível de emissões mais eficiente atinge aproximadamente 100g de CO2/km, mas pesando cerca de 800 kg, equipado com motor 1.0 flexfuel com menos de 70 cv de potência e sem direção hidráulica e ar condicionado. Já a média de consumo com a tecnologia HYbrid4, de acordo com os estudos, chega a 26,3 km/l.

No transporte público, o diesel ganha a companhia da eletricidade em novos projetos que prometem melhorar a vida de motoristas e passageiros – dentro e fora dos ônibus. Entre as montadoras, a Volvo expôs na Rio+20 seu primeiro ônibus híbrido produzido no Brasil. O veículo, movido a eletricidade e a diesel, faz parte de um lote de 60 adquiridos por operadores de Curitiba/PR, construídos sobre um chassi padrão, na configuração 4×2.

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Primeira unidade do ônibus Volvo híbrido
que rodará em Curitiba/PR

Segundo a Volvo, a tecnologia híbrida do coletivo, se comparado aos ônibus Euro 3, permite uma economia de combustível de até 35% e reduz em 90% as emissões de gases poluentes, além de não emitir ruído em cerca de 30% a 40% do tempo de operação. A marca explica que os dois motores, diesel e elétrico, funcionam em paralelo ou de forma independente, sendo que o motor elétrico é usado para arrancar o ônibus e acelerá-lo até 20 km/h e também como gerador de energia durante as frenagens.

MAN TGS 33.440 6X4, que roda com diesel e etanol

A MAN também instalou seu estande no Parque dos Atletas para expor, entre outras soluções, o VW Constellation 17.280 6×2 Híbrido, caminhão com sistema híbrido diesel-hidráulico, e o ônibus alemão Lion’s City, também com tecnologia híbrida diesel-elétrico. A montadora também destaca os caminhões movidos com biocombustíveis a base de cana-de-açúcar, como o MAN TGS 33.440 6X4, seu primeiro modelo flex que roda com diesel e etanol. Por fim, também foi apresentado o VW Constellation 17.190 abastecido com a Ultra Clean Diesel, biocombustível renovável que contribui para a redução das emissões de carbono do veículo.

O carro elétrico/híbrido é a solução?
Muito se criticou a Rio+20 pela falta de resultados práticos que produziu – o documento final primou muito mais pela política e belas palavras do que propriamente por compromissos e metas para se atingir os tais objetivos que a Conferência pretendia. As tecnologias híbridas que as montadoras apresentaram no evento não são surpresa no mercado. Por exemplo, o Mini E da BMW foi fabricado entre 2009 e 2010, e não emplacou.

Há quem argumente que o carro elétrico/híbrido não é a solução porque ele ainda consome uma espécie energia que vem de fontes que agridem o meio ambiente – basta ver a polêmica envolvendo a construção da hidrelétrica de Belo Monte. Sem falar que a fabricação de centenas de milhares de carros em série, não importa a que sejam movidos, já é uma atividade por si só bastante poluente. Ou seja, a indústria automotiva polui, quaisquer sejam os motores de seus veículos.

O documento final da Rio+20 reconhece que transporte e mobilidade são elementos centrais para o desenvolvimento sustentável e que o transporte sustentável gera “crescimento econômico”. Mas não dá pistas de como atingir esse objetivo. O único compromisso firmado é o de “ajuda internacional” aos países em desenvolvimento para desenvolver seu transporte. Mas também não diz como nem quanto nem o que é necessário para tal.

Políticas de redução de IPI e incentivo à renovação da frota são ótimas para o consumidor e para o mercado como um todo, mas têm impacto ambiental reverso, já que aumenta o número de carros nas ruas. Enquanto a indústria comemora números cada vez maiores de vendas, a sociedade ignora que o direito à mobilidade individual está passando por cima da inteligência de planejamento das cidades. Uma opção óbvia é o investimento pesado em transporte público, aumentando e melhorando as malhas viárias cobertas por linhas de ônibus e metrôs – mas a carta de intenções final da Rio+20, infelizmente, trata a questão de forma superficial.

Enquanto as ideias vindas de cima ainda parecem distantes, vazias e ineficientes, que tal você, amigo mecânico, começar a adotar soluções no seu dia a dia de trabalho e estimular pessoas ao seu redor? Coleta seletiva de lixo e descarte correto de peças, óleo e embalagens são atitudes simples que contribuem com o meio ambiente e geram resultados práticos na oficina. Porque, no final das contas, é a postura de cada um que deixa as cidades mais limpas e mantém nosso modo de vida em harmonia com a natureza.

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