A categoria máxima do automobilismo terá motores 1,6 litro de 6 cilindros, turbinados e com injeção direta a partir do ano que vem; mas com o auxílio de sistemas de recuperação de energia, a exemplo do que já acontece em carros de rua, o termo “motor” está ficando obsoleto
Fernando Lalli
Nos anos 80, a Formula 1 viveu o que se chamou de “Era Turbo”: motores 1.5 de quatro cilindros sobrealimentados com uma potência avassaladora: alguns propulsores chegavam a mais de 1000 cv em configuração de treino. Isso acabou em 1989, quando o regulamento proibiu os motores turbinados por questão de segurança. Desde então, os motores, naturalmente aspirados, foram diminuindo: primeiro em cilindros (de 12 para 10 e então para 8), depois em cilindradas (de 3,5 litros para 2,4 litros), depois em quantidade (da farra dos motores ilimitados para apenas oito unidades por ano). Tudo para trazer a categoria mais próxima da realidade do que é usado nas ruas (se é que isso é era possível) e continuar relevante como laboratório para novas tecnologias.
Motor da Renault para 2014: 1,6 litro V6 turbinado e com injeção direta. Diferente o bastante, mas não é só isso: note as baterias elétricas do ERS, o escapamento de saída única e o intercooler proeminente…
Pois em 2014, as regras farão a Formula 1 fazer o caminho contrário: agora, é a tecnologia que já existe em carros de passeio que vai ser aplicada na competição. A partir do ano que vem, os motores da Fórmula 1 terão a seguinte configuração: 1,6 litro, com seis cilindros em V a 90° de angulação, com turbo e injeção direta, tendo obrigatoriamente quatro válvulas por cilindro. Esse motor não pode ultrapassar 12.000 rpm (o limite para os V8 aspirados era 18.000 rpm). Estima-se que os motores 1.6 V6 turbinados cheguem a 600 cv de potência, contra 750 cv dos 2.4 V8 aspirados.
Há uma série de regras quanto ao design de peças do motor: por exemplo, o diâmetro da camisa do cilindro deve ser de 88 mm (+/- 0,1 mm), o que limita naturalmente o curso do pistão a 53 mm. O turbo deverá ser único e com apenas um estágio, com pressão de 3,5 Bar. O uso de materiais também é bastante limitado, para evitar que metais mais sofisticados (e inacessíveis) sejam usados por fabricantes e equipes com mais dinheiro.
Projeção da Ferrari para o carro de 2014. Note como o motor é pequeno…
A restrição chega também ao consumo de combustível: em nenhum momento a injeção do motor deve ultrapassar a vazão de 100 kg (ou 138 litros) de gasolina por hora. O tanque também está restrito a 100 kg de combustível. Vale lembrar que a medição de combustível na F-1 é em quilos e não em litros, por uma questão de praticidade.
Além disso, o novo motor deverá ser auxiliado por dois sistemas de recuperação de energia: o MGU-K (uma versão mais potente e ativa do atual KERS) e o MGU-H, que juntos estão ligados ao sistema ERS. Mas a integração entre o propulsor a combustão e esses novos componentes será tão íntima que o termo “motor” já deixa de definir completamente o que vai mover os F-1 daqui pra frente. Até o regulamento da categoria passa a usar outro termo para definir todo o conjunto: trocou a palavra “engine” (motor) pelo termo “Power Unit” (Unidade de Força).
Motor da Mercedes para a F-1 2014: boatos dizem que será o mais potente.
Mais que um empurrãozinho
Até a corrida de Interlagos, que encerrou 2013, era permitido aos carros da F-1 utilizarem um sistema KERS para adicionar 80 cv de potência ao motor por cerca de seis segundos. Agora, esse recurso será substituído pelo ERS (“Energy Recovery System” ou “Sistema de Recuperação de Energia”), sistema criado para recuperar e armazenar energia do carro, para alimentar (e também receber energia de) o MGU-K e MGU-H.
O MGU-K (“Motor Generator Unit – Kinetic” ou “Unidade Geradora do Motor – Cinética”), espécie de extensão mecânica do ERS, ligado ao virabrequim e que faz o papel do KERS de adicionar potência ao motor. A diferença é que os 80 cv por seis segundos do KERS serão multiplicados para 160 cv por 33 segundos. Outra função do MGU-K será impulsionar o carro sozinho nos momentos em que estiver se movendo pelos boxes. Pelo novo regulamento, o carro não poderá utilizar o motor a combustão quando estiver passando pelos pits.
Já o MGU-H (“Motor Generator Unit – Heat” ou “Unidade Geradora do Motor – Calor”) é o mecanismo ligado diretamente ao turbo que tem como objetivo evitar o “lag”, ou seja, o atraso de resposta à aceleração, mantendo a turbina girando. O MGU-H também pode converter o giro da turbina em eletricidade para o MGU-K ou para a bateria.
Apenas um MGU-K e um MGU-H podem ser usados. Toda a Unidade de Força tem peso mínimo regulamentado de 150 kg. Uma massa de peso concentrada muito maior que os motores de 95 kg usados até este ano. Isso muda totalmente o conceito de equilíbrio do carro e quem achar a melhor solução para tal vai sair muito na frente na próxima temporada – assim como quem tiver o conjunto mais confiável: o número de motores/Unidades de Força que o piloto pode usar durante a temporada caiu de oito para cinco. Um verdadeiro desafio para engenheiros das fabricantes de motores e projetistas dos chassis.
Transmissão também será afetada
Além da Unidade de Força, o câmbio tem novas e importantíssimas restrições: o número de marchas permitidas aumenta de sete para oito velocidades; mas as relações de marcha para cada piloto devem ser as mesmas em todas as corridas. Por exemplo, agora, Felipe Massa deve declarar no início do ano à FIA (Federação Internacional de Automobilismo) qual relação de marchas vai usar em sua Williams e mantê-la durante a temporada inteira, mesmo que precise trocar o câmbio.
Ou seja, Massa e todo o resto do grid serão obrigados a correr com a mesma relação de velocidades em circuitos completamente diferentes, como as ruas de Mônaco e as longas retas de Monza, na Itália. Uma relação de marchas diferente pode fazer com que um piloto seja rapidíssimo em uma pista e muito lento em outra, assim como a capacidade de confiabilidade e consumo da Unidade de Força e o equilíbrio do carro.
Projeção da Renault para 2014
Com tantas variáveis, podem pintar surpresas em 2014. Lembra-se da Brawn e seu difusor duplo em 2009, que deu o título a Jenson Button? Será que a dupla mágica da Red Bull, Sebastian Vettel e o projetista Adrian Newey, conseguirão manter a hegemonia na categoria? A resposta virá a partir do próximo dia 16 de março, na largada do Grande Prêmio da Austrália, que abre o próximo campeonato. Até lá, os doentes por automobilismo vão sofrer com a expectativa pelo resultado do que está sendo a maior revolução tecnológica dos últimos 20 anos na Fórmula 1.
Qual diâmetro real desses motores 1.6
Gostaria de saber, quanto CV se tira por litro deslocado de um F1 e quanto tempo dura.
Nelson, a Formula 1 utiliza gasolina, mas especialmente desenvolvida para o alto desempenho que esses motores exigem. Um abraço.
gostei da explicação, mas gostaria de saber que tipo de combustivel é usados nos casos da f1 e