Por Fernando Landulfo
Este ano comemoramos os 20 anos da introdução da injeção eletrônica nos veículos nacionais. Sim, 20 anos se passaram desde que a Volkswagen lançou o Gol GTI: “o primeiro carro nacional equipado com injeção eletrônica de combustível”.
Ah! Não tinha se dado conta. Pois é, parece que foi ontem… Isso mostra que você, graças a Deus, anda muito ocupado. E não fique chateado, mas sim muito orgulhoso de si mesmo. Afinal de contas, se por um lado você ficou mais velho, por outro ficou muito mais sábio. Afinal de contas, a introdução de novas tecnologias nos carros nacionais te forçou, guerreiro das oficinas, a buscar o aprimoramento. Ou seja: evoluir profissionalmente. Hoje, com absoluta certeza, você é um profissional muito mais capacitado do que há 20 anos.
Você se lembra como eram as coisas antes disso? Bem mais fáceis não é? Você aprendia a profissão apenas dentro da oficina. Depois era só ir adquirindo experiência. Como os veículos eram bem mais simples, uma caixa de ferramentas básica atendia a quase todas as necessidades. Ficar correndo atrás de tecnologia e equipamentos sofisticados? Não havia necessidade. Por quê?
Simples. Durante muito tempo você, mecânico brasileiro, permaneceu isolado da grande maioria das novidades, devido à estagnação tecnológica dos veículos nacionais provocada, principalmente, pela proibição das importações. Via de regra, apenas se atualizava com uma versão mais nova de um sistema antigo. Afinal de contas, seja lá qual fosse o modelo do carro: a alimentação era feita por carburador, a ignição por distribuidor, o câmbio era manual com embreagem, a maioria dos comandos era feita por meio de cabos e assim por diante.
Câmbio automático? Direção hidráulica? Comandos elétricos e pneumáticos? Ar condicionado? Vá de retro Satanás, de volta para a concessionária! Sistemas gerenciados por computador? Só nos seriados “A super máquina” e “Jornada nas Estrelas”.
Ah! E não podemos esquecer: você se mantinha o mais afastado possível do sistema elétrico do veículo. Afinal de contas, como dizia o velho ditado: “O mecânico cuida da mecânica. A parte elétrica fica por conta do eletricista”. Os colegas mais ousados, que constituíam uma exceção, se especializavam na regulagem de motores, cujos diagnósticos e ajustes exigiam leituras e a interpretação de algumas grandezas elétricas. Por exemplo: resistência de cabos de velas, rotores e tampas de distribuidor. Da mesma forma, a tensão de alimentação da bobina e do módulo de ignição. Não se esquecendo também de conferir o ângulo de permanência, a rotação de marcha lenta e a curva de avanço da ignição.
Ou seja, nada que um multímetro automotivo, uma pistola estroboscópica e algumas tabelas de especificações não dessem conta. Os mais afortunados dispunham de caríssimos analisadores de motores dotados de osciloscópios de ignição e analisadores de gases, que apesar de muito úteis, eram raramente utilizados.
Mas o que pouca gente sabia, naquele momento, é que as montadoras tinham como obrigação diminuir acentuada, mas progressivamente, o nível das emissões dos veículos novos a partir da década de 90. E isso só seria possível com a introdução de sistemas de gerenciamento eletrônico do motor.
Tal fato faria com que o “velho ditado” acabasse se tornando obsoleto. Mas não era um caminho fácil de percorrer. As pessoas teriam que mudar a sua forma de pensar, para poder sobreviver no novo mercado que estava por surgir. E o curioso é que as inovações aconteciam quase que simultaneamente. Foi uma época de grandes transformações.
O primogênito
Em 1989 surge o Gol GTI, equipado com o sistema de injeção LE-Jetronic e a ignição mapeada EZ-K. Esses sistemas, muito eficientes, baseavam sua manutenção na leitura direta de parâmetros, embora o sistema EZ-K dispusesse de uma lâmpada de advertência com uma codificação de falhas rudimentar.
Quase ao mesmo tempo, é lançado carburador eletrônico. Sim, aquele com ajuste automático da marcha lenta. O sistema dispunha de um atuador, um módulo de comando e um circuito elétrico que precisavam ser verificados. Da mesma forma apareceu a ignição estática mapeada.
Pois é, guerreiro das oficinas, você teve que rapidamente aprender a ler diagramas elétricos, testar componentes e compreender a estratégia de funcionamento de um módulo de comando. Ou seja: se tornar eu “expert” em eletricidade veicular. E quem não se lembra da correria. Velhos e novos profissionais tendo que assimilar conceitos de eletricidade, eletrônica e estratégias de comando automatizado. Termos como: “resistência”, “continuidade”, “tensão”, “mapeamento”, “corrente”, “centelha principal e de descarga” e “tempo de injeção”, se tornaram parte da rotina. Da mesma forma, componentes como: “micro interruptores”, “EPROM” e “termistores” passaram a fazer parte do vocabulário da oficina. Além disso, procedimentos como: “verificação de chicote elétrico” e instrumentos como: multímetro, osciloscópio e “BOB” (Brake Out Box), passaram a fazer parte integrante da sua vida profissional.
Mas isso foi só o começo. Não foi? No ano seguinte surgem sistemas de injeção e ignição digitais, dotados de rotinas de autodiagnóstico. Da mesma forma, são introduzidos, nos veículos nacionais, sistemas de segurança como os freios ABS e o Air bag. Isso, sem falar na transmissão automática e no climatizador controlados eletronicamente.
O acesso rápido a todos os recursos de manutenção tinha de ser feito por meio de um equipamento denominado scanner. Você teve então que adquirir e aprender a operar esses equipamentos, além de buscar treinamento e informação técnica sobre os novos dispositivos incorporados. Ou seja: se tornou também um “expert” em eletrônica embarcada. Lembra da caixa de ferramentas básicas? Pois é, tornou-se uma enorme coleção de sofisticadas ferramentas especiais, instrumentos de medição e equipamentos eletrônicos. Isso sem falar na biblioteca técnica que você formou. Além disso, você precisou aprender um novo idioma (inglês), para poder ler os manuais de reparação e operar os scanners dos veículos importados.
Deu para notar a grande evolução?
Isso sem falar nas transformações e melhorias que você teve que fazer em toda a sua oficina, para atender, bem, um público cada vez mais exigente e carente de bons prestadores. Afinal de contas, segundo o saudoso comandante Rolim Adolfo Amaro: “O cliente é o Rei”. E ele merece o melhor.
Pois bem, com o passar do tempo, como já era de esperar, os carros se tornaram cada vez mais tecnologicamente sofisticados. Mais recentemente surgiu o sistema de multiplexagem, que exigiu ainda mais de você. Não foi?
E as mudanças não pararam e não vão parar por ai. Em breve, teremos em nossas ruas veículos: híbridos, movidos por células de combustível, movidos a hidrogênio e sabe lá mais Deus o que.
Isso vai te obrigar a investir continuamente no seu aprimoramento pessoal (técnico e administrativo), assim como nos recursos da sua oficina. O processo de evolução profissional não para. Ele caminha junto com a evolução da tecnologia.
Você já caminhou muito. Mas precisa continuar. E lembre-se: Hoje você não é mais um simples mecânico. É um perito na reparação de complexos sistemas embarcados. Além disso, é um empresário do setor da reparação de veículos. E os empresários estão sempre de olho no futuro, buscando o aprimoramento e a evolução.