por Felipe Salomão
Nos últimos 100 anos, os veículos vendidos no mundo foram do vapor para gasolina rapidamente. Agora, a industrial mundial se prepara para deixar de produzir modelos com motores à combustão para fabricar carros elétricos e híbridos, que inclusive, já começam a ganhar espaço no mercado nacional, uma vez que apenas neste ano foram 49.052 unidades emplacadas no Brasil, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico – ABVE.
Contudo, por aqui esta transição deve ser um pouco lenta. De acordo com a Kolbenschmidt KS, que tem mais de um século de experiência na fabricação de peças de motor. “Os motores à combustão ainda terão uma vida longa no país, mas o que posso afirmar é que estamos há mais de duas décadas nos preparando para atender a essa nova realidade do mercado e as novas tecnologias de veículos elétricos e híbridos”, afirmou Ulrich Gnaedinger, Diretor Geral de aftermarket da América Latina da empresa, que falou com a Revista O Mecânico sobre o futuro dos veículos eletrificados, a importância do etanol e de como ele chegou
ao Brasil.
REVISTA O MECÂNICO: Quais os próximos passos da KS, o que ela pensa sobre os carros do futuro?
ULRICH GNAEDINGER: Somos especialistas tanto em produto para o motor quanto para a parte periférica do propulsor, como bombas, sensores, mecatrônicos, que estão totalmente inseridos no futuro do setor automotivo e com esse know-how tenho a certeza de que temos muito a contribuir para o setor. E a evolução desses componentes mecatrônicos deve incentivar ainda mais o crescimento projetado da subsidiária no Brasil.
O MECÂNICO: Como está a empresa no mercado de híbridos e elétricos?
ULRICH GNAEDINGER: O Grupo Rheinmetall está bem à frente no desenvolvimento de novas tecnologias com componentes mecatrônicos para veículos elétricos e híbridos, entre eles, módulo de baterias elétricas de alta voltagem e módulos térmicos que auxiliam no melhor gerenciamento térmico e eficiência da bateria. Também projetamos bombas de óleo, bombas de vácuo e bombas de água com acionamento elétrico, que auxiliam no sistema de lubrificação e arrefecimento desses veículos. Temos ainda sistemas elétricos de trem de válvulas e atuadores elétricos que atuam no sistema de combustão para veículos híbridos.
No aftermarket, os itens mecatrônicos para circulação de água e ar e refrigeração térmica já são muitos representativos no faturamento justamente para atender a manutenção de veículos com essas novas tecnologias.
Vale lembrar que os itens mecatrônicos também se aplicam em motores a combustão interna, que sofreram evolução para reduzir emissão de poluentes e melhorar o desempenho com redução de consumo de combustível, como as tecnologias em componentes aplicados nos propulsores 3 cilindros, assim como em veículos pesados Euro 6. Com essas inovações, o conjunto motriz a combustão ainda terá uma vida longa nos mercados da América Latina.
O MECÂNICO: Existe muita diferença de tecnologia, hoje, no desenvolvimento dos carros brasileiros em comparação com o resto do mundo?
ULRICH GNAEDINGER: A posição do etanol faz a grande diferença em relação aos outros continentes, por isso acredito que o caminho da América do Sul, considerando especialmente o Brasil, será um pouco diferente do resto do mundo. Por exemplo, Ásia, especificamente China, está focada para o motor elétrico. Já na Europa existe um mix maior entre as formas de energia para o motor. Por fim, o Brasil está mais direcionado para soluções como etanol híbrido, fotovoltaicas que já contemplam a redução de emissão de dióxido de carbono.
Em resumo, acredito que cada região seguirá por um mix diferente de fonte de energia para o motor e para as montadoras será um desafio atender essa diversidade de sistemas.
E em paralelo à toda essa transformação, a frota circulante vai continuar rodando e continuará exigindo peças de reposição por muito tempo ainda e a Rheinmetall, mesmo com a evolução de novas tecnologias vai permanecer fornecendo para o mercado peças para motores a combustão enquanto esses veículos existirem.
O MECÂNICO: Qual a vantagem de trabalhar para um país que é famoso por desenvolver carros elementares? Há troca de informações entre nações ou ajuda mútua?
ULRICH GNAEDINGER: Cada mercado é único, com maturidades diferentes, mas o princípio geral é parecido. O fato de o Brasil ter um volume maior de carros básicos, os chamados populares, não interfere em nada, pois a pressão para reduzir emissão e fazer motores mais eficientes já vem acontecendo e ganhará ainda muito mais corpo nos próximos anos, e o Brasil tem uma vantagem nesse futuro, com o seu know-how com o etanol e outras tecnologias sustentáveis.
Em cada país em que atuamos, atendemos o mercado de acordo com as características da frota local, mas todo o conhecimento de novas tecnologias e inovações é compartilhado com todas as subsidiárias do grupo. Por exemplo, aqui, no Brasil, apresentamos este ano o portfólio para atender veículos pesados Euro 6 e para linha leve lançamos vários itens para motor 3 cilindros, tendências mundiais para redução de emissões de poluentes.
Também é importante destacar que o mercado brasileiro é muito importante para o nosso negócio e deve concentrar as operações para a América Latina e se tornar a unidade mais importante depois da matriz na Alemanha. Para isso, temos provisionado investimentos na estrutura de aftermarket no Brasil e na América Latina como um todo para sustentar esse crescimento, pois é um mercado que tem muito para expandir.
REVISTA O MECÂNICO: Notamos que você fala bem o português, qual o segredo desse sucesso?
ULRICH GNAEDINGER: Em todos os países que trabalho procuro aos poucos aprender a língua para me aproximar das pessoas e entender a cultura local. Procuro aprimorar meu vocabulário a cada dia. Estou há 10 anos no Grupo Rheinmetall e já implantei subsidiárias para fomentar novos mercados na Ásia, África, inclusive em Singapura. No caso do idioma português, tenho uma grande vantagem, pois sou casado com uma brasileira, então já tenho uma maior familiaridade com a língua.
REVISTA O MECÂNICO: Quanto tempo está no País?
ULRICH GNAEDINGER: Por conta dessa minha conexão familiar, tenho o privilégio de conhecer o Brasil há mais de 30 anos, porém como turista. Mas desde o início de 2020, assumi esse novo desafio e sou responsável pelas operações da reposição no Brasil e América Latina como um todo. E a partir de 2022, me mudei para o Brasil, pois é muito importante a vivência para entender o mercado.
REVISTA O MECÂNICO: Como foi acolhido pelo brasileiro?
ULRICH GNAEDINGER: Eu fazia visitas recorrentes no Brasil, tinha contato direto com pessoas do time do Brasil e, também, com alguns clientes. E logo que assumi a diretoria geral da empresa, promovemos eventos regionais que me permitiram uma maior aproximação dos nossos clientes, além de entender melhor as particularidades de cada região. Posso afirmar que é um mercado muito dinâmico e que preza o relacionamento, muito mais que em outros mercados, e é muito prazeroso trabalhar com esse time e clientes.
Portanto, em geral, tanto no âmbito profissional quanto no pessoal, posso afirmar que fui muito bem recebido e estou feliz em ter essa experiência aqui no Brasil.