Estamos preparados para a inspeção veicular?

A inspeção de emissão de poluentes na cidade de São Paulo veio para ficar. E não há sombra de dúvidas que traz consigo inúmeros benefícios a toda sociedade:

 

– Ganha a população em geral que usufrui um ar mais saudável;

– Ganham os proprietários de veículos que economizam com combustível, além de conservarem melhor o seu patrimônio;

– Ganha a cidade que mantém seus monumentos limpos por mais tempo;
E, finalmente:

– Ganha a indústria da reparação automotiva, juntamente com a de autopeças, que tem seu mercado aquecido. Afinal de contas, ninguém melhor do que o “guerreiro das oficinas”, para colocar essa frota “em ordem”. Indiretamente ganha novamente a população, como um todo, que tem ampliada a oferta de emprego.

 

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De um modo geral, o programa vem se desenvolvendo bem. Mas, como dizia o poeta: “nem tudo são flores” e as inspeções já estão causando polêmicas. Por exemplo:

 

– Veículos reprovados, e que passaram por um processo de reparação, foram novamente reprovados na inspeção de retorno;

 

– Veículos previamente examinados, que não apresentam quaisquer sintomas de mal funcionamento, ou mesmo, códigos de falhas em seus sistemas de gerenciamento eletrônico do motor, foram reprovados.

 

É óbvio que ocorrências desse tipo causam aborrecimentos ao proprietário do veículo e enormes constrangimentos ao reparador. Mas por que será que isso está acontecendo?

 

Bem, antes de “atirar pedras” no programa é preciso refletir um pouco sobre alguns fatos muito importantes:

 

1) A inspeção é um processo de medição: no caso específico, mede-se a quantidade de CO, CO2 e HC nos fumos expelidos pelos motores ciclo Otto e a opacidade da fumaça expelida pelos motores ciclo Diesel;

 

2) Toda medição utiliza pelo menos um instrumento: para medir os gases dos motores ciclo Otto utiliza-se um analisador infravermelho e para medir a opacidade da fumaça dos motores Diesel utiliza-se um opacímetro. Ambos devidamente complementados por um tacômetro. Esses instrumentos devem obedecer a especificações técnicas e nem todos os modelos atendem ao programa, afinal devem ser aprovados pelo INMETRO e verificados periodicamente pelo IPEM;

 

3) Toda medição segue um procedimento: as medições devem seguir etapas pré-definidas, não cumprir uma única etapa pode comprometer o resultado final. Essas etapas encontram-se inseridas nos programas que controlam os equipamentos de medição e o operador não tem como burlar o procedimento. Além disso, paralelamente, atuam outros sistemas que visam garantir a confiabilidade de toda a operação, como o sistema de gestão pela qualidade (ISO 9000).

 

Como se preparar

 

Com base nisso, podemos formular algumas dicas, com relação aos veículos que passam pelas oficinas, antes de ir ao centro de inspeção:

 

1) É imprescindível medir as emissões dos veículos, antes de enviá-los ao centro de inspeção, principalmente, aqueles que sofreram reparação por já terem sido reprovados. Não importa se não apresentam sintomas de mal funcionamento. Confiar no preço do veículo, na sua idade, aparência ou funcionamento é um risco elevado. Muitas rotinas de auto-diagnóstico não são sensíveis à pequenas alterações dos níveis de emissão e não geram códigos de falhas detectáveis pelos scanners;

 

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2) A medição deve ser feita somente com equipamentos que atendam a todas as exigências técnicas descritas nas normas ou procedimentos de inspeção. Eles devem estar devidamente calibrados e, de preferência, aprovados pelo INMETRO. Além disso, aumenta a credibilidade ser verificado pelo órgão de metrologia legal;

 

3) A medição na oficina deve seguir rigorosamente o procedimento oficial. Tal atenção deve ser redobrada, se o equipamento disponível não possuir controle por computador que, via de regra, tem instalado um software similar ao utilizado na inspeção. Neste caso todo o procedimento é executado manualmente. Qualquer desvio na execução pode alterar drasticamente os resultados. É muito importante ficar atento a detalhes como: temperatura de funcionamento do motor, rotação de marcha lenta, rotação de corte, modo como o motor é acelerado e o tempo decorrido entre a mudança da rotação e a anotação da medição;

 

4) É de grande utilidade conseguir, junto à empresa que realiza inspeções, uma oportunidade de acompanhar algumas medições, com o intuito de absorver a metodologia.

 

De olho no motor

 

É sempre importante lembrar que as emissões de um veículo não estão relacionadas apenas ao seu sistema de alimentação. O estado mecânico do motor (compressão dos cilindros e vedação das válvulas), a temperatura de funcionamento, a estanqueidade dos dutos de admissão e de escapamento, o sistema de ventilação positiva do cárter, a folga das válvulas, o estado da bateria, o estado do sistema de ignição, o estado dos filtros, a qualidade do combustível e até mesmo o estado do óleo lubrificante, podem alterar drasticamente as emissões. Isso sem falar nos dispositivos de controle de emissões (catalisador, cânister, EGR, sopradores, etc.).

 

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Também não podem ser esquecidos os acessórios de conforto, cujo mal funcionamento, ou instalação indevida, podem alterar o comportamento do motor. E quanto mais moderno é o veículo, mais sensível a esses fatores são as suas baixíssimas emissões. Por essa razão, ao se pesquisar a causa do aumento das emissões, deve-se levar em conta todos esses fatores. Afinal de contas, uma válvula termostática de um modelo diferente do original, assim como, uma mangueira de vácuo mal instalada, podem alterar as emissões do veículo.

 

Use e abuse dos equipamentos

 

O controle eletrônico do motor realmente otimizou a formação das misturas, mas não extinguiu os demais sistemas e componentes do veículo de continuar interferindo nas emissões. Por essa razão, vacuômetros, osciloscópios de ignição, medidores de compressão, voltímetros, amperímetros, lâmpadas estroboscópicas e muitos outros instrumentos, não devem ser abandonados em prol do scanner. Essa útil ferramenta atua apenas no sistema de eletrônica embarcada. O resto continua nas hábeis mãos do profissional, que não pode deixar de se atualizar, mas que também não deve esquecer ou deixar de lado os antigos conceitos, que continuam valendo.

 

Carros antigos na fila da inspeção

 

Esta preocupação com o passado não é saudosismo. Ela se baseia na tendência natural de expansão do programa de inspeção e no sensoriamento remoto que, por sinal, já se encontra em operação na capital paulista.

 

Atualmente, estão sendo inspecionados veículos do ciclo Otto, fabricados entre os anos de 2003 e 2008. Para o ano que vem está prevista uma ampliação da frota, retroagindo o ano de fabricação para 1998 ou 1995. Veículos desta época são equipados com sistemas de injeção e ignição, cuja prática de reparação tende a ser perdida, juntamente com seus manuais e anotações. Muitos jovens, que iniciaram há pouco tempo na profissão, não tiveram a chance de passar por treinamentos nesses sistemas, mas certamente terão que repará-los.

 

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O mesmo tende a acontecer com o velho carburador e distribuidor, já esquecidos pela grande maioria dos reparadores. Se o programa de inspeção continuar a evoluir, na mesma proporção estimada, em 2011 a frota inspecionada estará compreendida entre os anos de 1988 (ou 1985) e 2010. Esta faixa atinge os veículos carburados. E quem irá repará-los?

 

Hoje em dia, conta-se nos dedos os especialistas remanescentes. Muitos colegas afirmam que não vale mais a pena investir nesta tecnologia ultrapassada, devido a pouca quantidade de veículos. Outros defendem a teoria de que os proprietários dessas “relíquias” não estão dispostos ou simplesmente não podem gastar o necessário com manutenção.
Mas será mesmo?

 

Bem, segundo dados extraídos, em 16/06/2009, do site do DETRAN SP, a frota de veículos ativa, fabricada entre 1985 e 1990 totaliza, apenas na capital paulista, 1.137.895 automóveis. Ou seja, uma enorme quantidade de clientes necessitará de revisões preparatórias e uma boa parte de revisões corretivas, devido a reprovações.

 

Já o que tange a disponibilidade de recursos, certamente pode-se esperar dos proprietários desses veículos o investimento necessário, devido a obrigatoriedade da inspeção e a necessidade da aprovação.

 

Isso sem falar no programa sensoriamento remoto, que atualmente fotografa nas ruas de São Paulo as placas dos veículos poluidores e os “convida compulsoriamente” a comparecer a linha de inspeção.

 

Eu, se fosse você, tiraria lá do fundo baú, todos aqueles manuais, catálogos, ferramentas de reparo de carburador, distribuidor e tabelas de regulagem de motor. Pode ser que você precise deles muito em breve.

 

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