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Especial: Mulheres à frente da manutenção automotiva

Empreendedoras que se dividem entre a gestão do negócio e o chão da oficina quebram paradigmas de gênero no segmento

 

Assim como em qualquer área, a mecânica automotiva não é um bicho de sete cabeças. “Qualquer pessoa que realmente queira isso para sua vida pode se tornar extremamente competente”. É assim que Fernanda Saldanha, proprietária do MFJ Auto Center em Angra dos Reis/RJ, define sua trajetória como mecânica.

Independentemente de profissão ou gênero, um dos pilares para uma carreira de sucesso é a motivação. Fernanda, assim como outras mulheres, viu o segmento de reparação não apenas uma forma de se manter ativa no mercado de trabalho, mas também como um caminho de se “jogar de cabeça” no empreendedorismo em uma atividade que a realizava pessoalmente. Seu serviço diário se alterna entre a gestão do negócio e o chão de oficina – suspensão é a especialidade da casa.

Como a maioria dos profissionais, Fernanda começou a ter contato com oficina de manutenção ainda criança, assim como sua irmã, Juliana Saldanha, que também é mecânica. Elas contam que a manutenção automotiva foi um caminho paralelo ao que seu pai fazia: mecânica náutica. “Com o tempo fui gostando desse negócio de mexer em veículos, porém, os terrestres eram os que mais me interessaram, para o desgosto do meu pai”, brinca Fernanda.

Fernanda e Juliana Saldanha
Fernanda e Juliana Saldanha

Juliana destaca que desde criança tinha gosto pela mecânica por conta da influência do meu pai. “Eu o via fazendo alguns procedimentos e aí comecei a querer fazer também, porém, com automóveis”. Apesar de já ter sua oficina desde 2008 em Barra Mansa, no sul do Rio de Janeiro, Fernanda quis expandir seu olhar e então decidiu mudar de cidade. “Nós tínhamos essa oficina em Barra Mansa, mas decidi vir para Angra dos Reis, que era onde meu pai também trabalhava. Aqui abri outra oficina focada em suspensão”.

Fernanda comenta que o conhecimento foi essencial para o sucesso do negócio. “Quando você que tem seu próprio empreendimento, você tem que entender de tudo, inclusive do serviço prestado. Por isso eu me especializei na profissão. Fiz curso de alinhamento de rodas e montagem de pneus”. Além de suspensão, Fernanda destaca que também já trabalhou com motores. “Além de me aprimorar, busco dividir o que aprendo com a minha equipe. Essa troca de conhecimento é essencial na oficina”.

Fernanda Saldanha, proprietária do MFJ Auto Center

EXPERIÊNCIA DE VIDA

A busca por conhecimento também foi um alicerce na carreira de Lara Lopes, empresária moçambicana refugiada no Brasil desde 2013. De lá para cá, Lara já trabalhou em grandes empresas de TI, profissão de formação, além de ter feito curso de empreendedorismo no SEBRAE: “Quando cheguei ao Brasil, obtive ajuda de um banco para poder investir em um negócio próprio. Porém, na época não queria criar uma oficina porque não tinha conhecimento. Então empreendi em outra coisa”.

A questão da mecânica veio surgir justamente em um ano atípico, em 2020. “Em uma conversa que tive com um amigo brasileiro que conheci na faculdade de TI, ele me contou que tinha trabalhado no segmento automotivo e me convidou a tentar empreender nisso, juntando nossos conhecimentos”, conta.

Nessa mesma época, Lara havia sofrido um acidente e a vontade de empreender só crescia mais ainda. “Não queria mais trabalhar pra mais ninguém”.

Esses dois impulsos foram suficientes para que Lara buscasse clientes e enfim formasse uma equipe preparada para colocar no mercado a Oluchi Reparações Automotivas.

MFJ Auto Center

Atualmente, Lara gerencia sete funcionários para atender principalmente veículos do corpo de bombeiros, penitenciárias e da Comgás. “Trabalhamos em parceria com a gerenciadora de cartões NEO, que é a companhia que possui clientes interessados e intermedia esse processo com outras empresas prestadoras de serviço. Nós fazemos as cotações e a NEO se encarrega de fazer a mediação entre as duas partes”.

Antes mesmo dos contratos assinados, Lara comenta que foi buscar no mercado uma equipe extremamente capacitada. “Aqui comigo trabalha outra mulher, a Eunice Fernando Xavier que é engenheira mecânica. Ela que faz todo o atendimento e ver qual é o problema do carro quando chega no pátio. Também trabalho com um refugiado venezuelano que está aprendendo cada vez mais do segmento brasileiro. Ele já teve oficina em seu país de origem e está se adaptando à nossa frota”.

Na hora de contratar, Lara deixa claro que o conhecimento técnico e a responsabilidade com a profissão é a base para a seleção. “A cada funcionário que mandava currículo, a gente pedia um teste, porque eu queria saber exatamente a responsabilidade que a pessoa tinha com o trabalho e se realmente tinha o conhecimento que precisávamos”.

Ainda sobre sua equipe, a empresária completa: “Não há nada como o que estou vivendo hoje. Estou à frente de um projeto que posso ajudar vários tipos de pessoas, inclusive aqueles como eu, refugiados. Acredito muito no potencial de cada um que está aqui dentro”.

NOVAS TECNOLOGIAS NA OFICINA

Ambas as gestoras mostraram entusiasmo quanto às novas tecnologias que o segmento automotivo apresenta, inclusive quanto o atendimento de veículos elétricos ou híbridos que logo chegaram ao pátio da oficina. Para Fernanda, é necessário que o profissional queira evoluir tal qual o setor. “A gente tem que se especializar, a profissão como um todo tem que se atualizar. Eu penso em me atualizar para que eu sempre consiga atender meu cliente da melhor forma. Se chega algo que não conheço na oficina, já vou na hora buscar informações sobre tal tecnologia. Sempre leio em grupos que participo sobre carros elétricos e híbridos, inclusive, gosto muito pela questão ecológica”.

Juliana Saldanha também mostra muito interesse pelas novidades do setor: “Eu quero muito aprender a mexer em veículos elétricos e quero que isso ocorra logo, pois, acho que vai ser bacana ter essa experiência, principalmente na primeira vez”.

Lara Lopes, proprietária da Oluchi Reparações Automotivas e sua equipe

Já Lara, na posição de administradora da oficina, alerta sobre a importância de atualizar sempre sua equipe quanto às novidades do mercado. “Estamos no começo, mas estamos indo muito bem. Hoje eu estou buscando cursos profissionalizantes para todos os meus funcionários. Gosto da ideia de que todos aqui dentro tenham gana em aprender cada dia mais”. Ela ainda destaca que não há tempo ruim para aprender. “Sempre haverá algo que teremos que descobrir no setor de mecânica. Eu sempre indico que os mecânicos daqui façam cursos aos fins de semana ou tirem pelo menos uma hora do dia para o aprendizado”.

ATENDIMENTO E FIDELIZAÇÃO

O atendimento é um pilar importante para o sucesso da oficina mecânica. Apesar do cliché que “mulheres são mais atenciosas ao lidar com o público”, é necessário mais do que isso para fidelizar a clientela.

Fernanda relata que trabalha para fazer da transparência com o cliente um dos seus diferenciais. “Hoje eu trabalho com a política de fazer o que realmente é necessário. Quando o cliente chega aqui, a primeira coisa que passamos é um panorama completo de qual é a situação do veículo e como resolvê-la”.

Sua irmã, Juliana, destaca que o cuidado também é fundamental para ver aquele cliente novamente na oficina. “Sempre faço tudo com muita atenção, carinho e respeito. A gente se dedica bastante para fazer tudo com amor aqui na oficina e assim atender às expectativas do cliente”, comenta.

Na Oluchi Reparações Automotivas, o feedback é essencial para o aperfeiçoamento do atendimento. Lara comenta que a fidelidade construída com seus clientes é um dos principais motivos para que ela queira seguir em frente todos os dias com o negócio. “Vejo que começamos com o pé direito. A gente tem tido um retorno excepcional dos nossos clientes. Isso move a equipe e a mim mesma em mostrar que estamos todos juntos em prol de um objetivo: entregar um serviço de qualidade”.

Outro ponto que chama atenção das mecânicas é a readequação do setor quanto ao atendimento igualitário. Por conta dessa mudança, há cada dia mais mulheres dentro das oficinas, não apenas como mecânicas, mas também como clientes. Fernanda inclusive ressalta que o empoderamento feminino ajuda na hora de criar uma afinidade maior com suas clientes. “Atualmente, é muito evidente que as mulheres são independentes, inclusive com os cuidados de seu próprio carro. Havia e infelizmente ainda há para algumas pessoas um tabu muito grande quanto a participação das mulheres no segmento automotivo, mas sou a prova viva, assim como muitas das minhas clientes, que podemos entender de absolutamente qualquer coisa que tivermos interesse”.

Quando questionadas sobre seus diferenciais em um mercado cada dia mais exigente, em que muitas vezes o dono do veículo já chega entendendo superficialmente do problema que o veículo carrega, todas concordam que mostrar profissionalismo no que fazem é essencial para dar segurança e credibilidade.

Lara relata que “a qualidade dos trabalhos que a gente realiza na oficina é essencial. Procuramos fazer tudo com muita certeza, realizando testes e diagnósticos assertivos. O foco é que o cliente não retorne, exceto que necessite de outro reparo. Fazemos a manutenção torcendo que ele traga outro veículo, seja de um amigo ou familiar, pois sabemos como o boca a boca é algo importante para a expansão da Oluchi”, finaliza.

Já Fernanda baseia seu diferencial não só no serviço em si, mas em toda a oficina, desde a qualidade do reparo até a limpeza do local: “Um dos principais pontos da minha oficina é a organização, pois aqui somos bem exigentes com a limpeza, qualidade e atendimento. Quando você tem um bom ambiente faz com que o cliente se sinta em casa. Tem gente que já falou que nosso banheiro é mais limpo do que da casa dele, acredita?! Não é porque é uma oficina que tem que ser sujo. Muita gente já falou que aqui nem parece oficina de tão organizado e limpo”.

Juliana, que hoje trabalha com sua irmã de Angra dos Reis, também destaca que o cliente se sentir em casa é o que torna o MFJ Auto Center diferente de seus concorrentes: “Por conviver com oficina desde criança, eu e minha irmã aprendemos a tornar este lugar prazeroso de ficar, seja por 5 minutos ou o dia inteiro”.

Lara e as irmãs Fernanda e Juliana traçaram seu lugar no segmento sem se apegar a paradigmas – que, afinal, são quebrados à medida que constroem uma carteira consistente de clientes fiéis. No mês que marca a celebração do Dia Internacional da Mulher, comemoração esta que nasceu da busca por melhores condições de trabalho e direito ao voto, hoje vemos mecânicas e empreendedoras enfim se espalhando e transformando o segmento automotivo para melhor.

Texto: Raycia Lima

Fotos: Fernando Lalli/Arquivo pessoal

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