Biodiesel e problemas com a nova formulação no chão de oficina

Com a evolução da matriz de combustíveis no Brasil, o biodiesel se consolidou como componente estratégico do diesel comercializado no país. Atualmente, o diesel contém 15% de biodiesel (B15), e há uma perspectiva de avanço para B20 e B25 até 2030. Essa mudança traz benefícios claros, como maior índice de cetano, que melhora a queima do combustível, e maior lubricidade, fundamental para a proteção de bombas e injetores de alta pressão. No entanto, a introdução crescente do biodiesel também trouxe novos desafios operacionais para oficinas e mecânicos. 

Um ponto crítico destacado por Diego Riquero Tournier, Gilles Grimberg e Idalécio Campos (Mineirinho) é a degradação do combustível, que pode ocorrer por oxidação química ou pela presença de água. A água no tanque é o principal catalisador para formação de borra microbiana, que obstrui filtros, aumenta consumo de combustível e eleva emissões. Já a borra química, resultado de envelhecimento e oxidação do combustível, forma verniz no fundo do tanque, na bomba de baixa e de alta pressão, prejudicando a performance do motor. Identificar precocemente esses problemas é fundamental. Um dos primeiros sinais perceptíveis é a obstrução recorrente dos filtros de combustível, que indica degradação do diesel ou armazenamento inadequado. 

Outro fator que influencia diretamente a durabilidade do sistema de injeção é a aplicação do veículo. Motores Euro 5 ou Euro 6, por exemplo, projetados para rodar em condições mais contínuas e com carga adequada, sofrem desgaste acelerado em trajetos urbanos curtos, com frequentes partidas e paradas. Nessas condições, o combustível não atinge a temperatura ideal da câmara de combustão, favorecendo a formação de depósitos de verniz e micro-organismos. Por isso, ajustes nos intervalos de manutenção e atenção ao perfil de uso do veículo são fundamentais para minimizar problemas.

Boas práticas de manutenção incluem a drenagem regular de tanques e filtros separadores de água, a substituição periódica de filtros de combustível conforme orientação do fabricante, a análise visual e laboratorial do diesel, e o uso de tratamentos químicos periódicos. Veículos leves, como SUVs e picapes, devem receber aplicação preventiva a cada 5 mil quilômetros, enquanto caminhões e máquinas fora de estrada seguem intervalos mais longos, de 60 mil quilômetros ou 250 horas de operação. A aplicação correta de biocidas deve ocorrer apenas mediante identificação de contaminação microbiana, evitando o uso indiscriminado que compromete a lubricidade do combustível. 

A escolha de aditivos e produtos químicos também exige atenção. Produtos não homologados ou de eficácia duvidosa podem reagir com materiais plásticos dos tanques, retentores e conexões, comprometendo todo o sistema de alimentação. O uso de produtos recomendados pelos fabricantes garante compatibilidade com os materiais e preserva a integridade do sistema de injeção. Além disso, manter registros documentais das análises de combustível, incluindo amostras coletadas de veículos atendidos, permite identificar problemas posteriores e proteger a oficina em eventuais disputas com clientes. 

O armazenamento do combustível é outro ponto crítico. Combustível armazenado em tanques sem inclinação adequada ou em locais onde ocorre grande variação de temperatura pode acumular água e sedimentos. A Agência Nacional do Petróleo determina a drenagem semanal dos tanques de combustível, mas a prática ainda é negligenciada em muitos postos. Veículos abastecidos com diesel adulterado ou com proporção incorreta de biodiesel (por exemplo, S500 com apenas 1,5% de biodiesel em vez dos 15% previstos) sofrem danos em bombas e bicos injetores, evidenciando a necessidade de fiscalização e atenção à qualidade do combustível. 

O papel do mecânico se torna estratégico nesse cenário. Mais do que realizar reparos, ele atua como educador, orientando clientes sobre boas práticas de abastecimento, armazenamento e manutenção. Diagnósticos precisos, aplicação periódica de tratamentos químicos e acompanhamento da qualidade do diesel garantem a longevidade do sistema de injeção e a eficiência do motor. Com a crescente adoção de biocombustíveis, o conhecimento técnico sobre biodiesel não é apenas diferencial, mas requisito essencial para o profissional que atua em oficinas modernas, capazes de atender às demandas de motores de alta pressão, caminhões, máquinas e veículos leves com tecnologia avançada de injeção. 

Em resumo, o biodiesel oferece vantagens importantes, mas exige cuidados rigorosos. Armazenamento correto, drenagem regular, substituição adequada de filtros, tratamento químico periódico e atenção ao perfil de uso do veículo são práticas indispensáveis para reduzir riscos de degradação do combustível e proteger o sistema de injeção. Ao aplicar essas práticas, o mecânico não só garante a performance do motor como também agrega valor ao serviço prestado, tornando-se agente de mudança e referência técnica no mercado automotivo. 

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