Anualmente as indústrias de autopeças e reparação perdem milhões com a falsificação.
Sem qualidade, esses produtos se espalham pelas oficinas, atrapalhando o serviço dos reparadores honestos e pondo em risco a segurança dos usuários.
Victor Marcondes
A substituição de peças, durante a manutenção, exige muita atenção, principalmente, na hora da compra. Apesar de ser um procedimento “corriqueiro”, muitos reparadores são enganados e acabam instalando produtos falsos, seja por falta de informação ou mesmo dificuldade para identificá-los. Existe também uma minoria de “maçãs podres”, que desonra a classe, e por pura ganância, compactua com o mercado ilegal.
Para combater esta prática, o reparador consciente precisa se informar, ao máximo, sobre os produtos “piratas” para não adquiri-los. “De maneira geral, a peça falsificada não atende às especificações e criticidades do veículo que ela pretende equipar. São fabricadas sem os mínimos requisitos exigidos pelas montadoras”, explica Antônio Carlos Bento, coordenador do Grupo de Manutenção Automotiva (GMA).
Os falsificadores agem em diversas áreas da economia, desenvolvendo produtos sem qualidade e que, geralmente, possuem demanda em larga escala. De acordo com Bento, no setor de reposição, os maiores alvos são peças de alto giro, como bronzinas, pistões, molas, amortecedores, pastilhas, lonas, rolamentos, faróis, lanternas, lâmpadas, cabos e correias. “Esses produtos já estão em processo de certificação compulsória acreditada pelo INMETRO, uma forma de coibir a produção interna e importação de peças falsificadas no País”, diz.
Para impedir a comercialização de peças falsas, o relatório da CPI da Pirataria e Falsificação, implantada pela Câmara dos Deputados Federais de 2004, rastreou as principais regiões por onde chegam e saem os produtos piratas. Baseado na pesquisa, Bento diz que continentes como a Ásia e Leste Europeu são apontados como os locais de origem destes componentes. Ainda segundo ele, no Brasil, as portas de entrada estariam concentradas em Corumbá/MT e Foz de Iguaçu/PR, locais de onde as peças partem e depois são distribuídas a fim de concorrer no mercado de forma desleal.
Outras práticas muito comuns são os crimes de contrabando e sonegação fiscal. Com isto, afirma Bento: “há o subfaturamento que representa a importação e exportação de bens por preços bem inferiores ao do mercado internacional. Essa é uma forma de remeter lucros para o exterior e de acumular um fundo clandestino (caixa dois) em um paraíso fiscal, reduzindo, assim, a tributação em solo de destino da peça de parte das suas verdadeiras receitas e lucros”.
Na prática
Além dos danos financeiros à indústria, o uso do produto falsificado pode prejudicar o reparador gerando desde um simples retrabalho até um processo judicial, se houver acidente em decorrência da má qualidade da peça instalada.
“Comercializar produto falsificado como verdadeiro ou perfeito, incide em diversos crimes, como fraude no comércio, artigo 175 do Código Penal, cuja pena é fixada de seis meses a dois anos de prisão ou multa, bem como crime contra relação de consumo, artigo 7º da Lei 8.137/90, com pena de dois a cinco anos de detenção ou multa; crime de sonegação fiscal, tipificado na Lei 4.729/65, com pena de seis meses a dois e multa de até cinco vezes o valor do tributo”, alerta Bento.
Se um cliente solicitar a utilização de uma peça falsa, o reparador deve se negar, justificando estar protegendo a segurança do cliente e do seu negócio.
César Samos, gerente técnico da Mecânica do Gato, de São Paulo/SP, diz que “uma vez um proprietário optou por comprar a peça que precisava ser substituída no veículo, um medidor de massa. Orçamos um produto Bosch, mas ele alegou que era muito caro e, além disto, não confiava em nossos fornecedores. Ele nos trouxe uma peça quase dez vezes mais barata, mas após a instalação, antes mesmo do carro sair da oficina, passou a apresentar uma série de problemas”.
Uma das recomendações feita por Samos na hora da manutenção é “se o mecânico tiver como detectar que a peça é falsa, não utilize, pois o barato pode sair caro. Antes de instalar um produto pirata, pense que além de provocar um acidente sério, o cliente pode ficar parado na rua a noite e sofrer um assalto, entre outros inconvenientes.”
Como se prevenir
Apesar da grande semelhança entre as peças originais e piratas, existem formas de se prevenir contra a ilegalidade. “O mecânico deve ficar atento para a disparidade de preço, ou seja, se há uma grande diferença entre um componente e outro”, observa Mário Guitti, superintendente do IQA (Instituto da Qualidade Automotiva). Outra dica para se proteger, continua Guitti, “é buscar peças certificadas, pois é a garantia que a empresa possui processos rigorosos e sistemas de gestão bem implementados e avaliados por um organismo neutro e com experiência no assunto”.
A nota fiscal também é essencial na aquisição do produto, pois garante a procedência, a troca em caso de problema e põe fim a informalidade. “Preferimos comprar peças sempre de distribuidores de grande porte, principalmente, itens como embreagem, molas e cabos. Componentes falsificados são adquiridos com mais incidência em lojas pequenas. O ideal é trabalhar com fornecedores maiores, que sejam autorizados e representem o fabricante de verdade”, recomenda Francisco Campani, técnico da especializada Josmar, de São Paulo/SP.
De acordo com Guitti, atualmente, o mercado brasileiro de autopeças perde em torno de 5% e 10% com a pirataria e a falsificação, presente hoje em todo o território nacional. “Segundo dados da Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF), o volume anual da falsificação e do contrabando de autopeças no Brasil chega a R$ 3,5 bilhões”, revela.
Para combater a pirataria, as principais entidades automotivas do País desenvolvem programas de conscientização, divulgando informações importantes para coibir a venda de peças falsificadas. O GMA, por exemplo, está criando uma central de inteligência e disque-denúncia. Além disto, coordena a campanha Carro, Caminhão e Moto 100%, assinada pelo IQA, que incentiva o motorista a verificar a procedência das peças utilizadas ou comercializadas pelo reparador.
O Sindipeças, por sua vez, formou um grupo de estudo para incentivar a certificação compulsória de componentes automotivos acreditada por meio do Inmetro. “Isso representa um grande avanço e uma enorme barreira para a entrada de produtos de origem duvidosa e que não atendem às mínimas especificações exigidas pelas montadoras”, analisa Bento.
O combate à pirataria é de extrema importância. Mas só funciona se o reparador trabalha com ética e a cidadania. Desta maneira, vai realizar sempre um excelente atendimento, conquistando uma boa reputação e garantindo o seu sucesso profissional.
Dicas para evitar as peças falsificadas:
• Só compre produtos com Nota Fiscal. Ela é garantia de originalidade e contra problemas futuros
• Só compre produtos diretamente da rede de fornecedores confiáveis;
• Nenhum produto é fornecido sem embalagem ou logomarca. Nunca compre peças sem estas identificações
• Não compre produtos avulsos
• Desconfie de promoções de venda com peças de valor muito baixo ou em locais de venda não apropriados
• Sempre que surgirem dúvidas em relação à originalidade de um produto ou sobre o local de venda, entre em contato com o fabricante. Uma equipe fará a verificação
• Vender produtos falsificados é crime e quem o pratica está sujeito à sanções legais