Ferramentas específicas como a máquina recicladora de fluido de ar-condicionado são indispensáveis para o bom resultado do serviço no veículo; saiba por quais motivos não se pode pular etapas no reparo do sistema de climatização
Se você trabalha com linha leve, tente se lembrar de quantos veículos sem ar-condicionado passaram recentemente na sua oficina. Certamente, uma minoria. Há alguns anos, o sistema de climatização passou de opcional desejado para um equipamento indispensável. Junto com a direção assistida, vidros elétricos e outros itens de conforto, o ar-condicionado faz parte do “kit dignidade” que já virou padrão entre quase todos os zero-km e é cada vez mais exigido pelos consumidores no mercado de seminovos e usados.
Isso significa, consequentemente, que há uma crescente demanda por reparos do sistema de climatização. É uma oportunidade para o mecânico proprietário que procura diversificar os serviços da sua oficina e, para quem é colaborador, a especialização se torna um diferencial no mercado de trabalho.
Ao migrar para o ramo da climatização automotiva, profissionais de mecânica devem ter em mente que esse tipo de serviço não dá espaço algum para o improviso. Manutenção de ar-condicionado exige informação atualizada, ferramental adequado e disciplina.
Conhecer o sistema não é necessário somente para quem é especializado ou pretende se especializar. Sabe aquele hábito de abrir as válvulas do sistema para esgotá-lo, deixando o gás jorrar na atmosfera? Se você ou sua oficina ainda fazem isso, perca esse hábito. O fluido refrigerante (também chamado de gás) contido dentro do sistema pode ser prejudicial à saúde: o contato com a pele pode causar queimaduras e, em contato com os olhos, pode congelar a retina. E se não bastasse, ele também impacta no efeito estufa.
Inspetor técnico da Mahle, Caique Caio Barbosa explica que o grau poluente do fluido é mensurado por um índice chamado GWP (“Global Warming Potential”, ou “Potencial de Aquecimento Global”). O índice GWP do fluido R134a (o mais comum em uso atualmente) é 1.500 – ou seja, cada 1 kg de R134a equivale a 1.500 kg do principal elemento causador do efeito estufa: o dióxido de carbono (CO2).
Futuros gases, segundo o especialista, terão GWP menor, como o caso do R1234yf, cujo GWP é apenas 4. Mas o R1234yf, que ainda possui aplicações muito específicas, tem outro problema: é altamente inflamável. Portanto, simplesmente liberá-lo no ar em um ambiente de oficina pode ser bem arriscado.
Como a manipulação desses fluidos requer tantos cuidados, é recomendável que a oficina não só tenha a informação técnica sobre o sistema como, também, tenha acesso a uma máquina recicladora de gás refrigerante de ar-condicionado. Os principais benefícios de investir em um equipamento desse são a recuperação do fluido, executar a função de vácuo para remover a umidade do sistema e fazer a aplicação das quantidades corretas de fluido refrigerante e óleo no circuito.
DEVO INVESTIR EM UMA MÁQUINA RECICLADORA?
O valor de aquisição de uma máquina recicladora é substancial, principalmente para oficinas de pequeno porte. Por isso, qualquer investimento desse tipo requer planejamento estratégico. O gestor da oficina precisa de um levantamento de dados concreto sobre o fluxo de serviços que ele oferece para entender se o volume de reparos é capaz de cobrir os custos mensais de manutenção daquela máquina, conseguir o retorno do investimento e, consequentemente, obter lucro. Parcerias com outras empresas de manutenção automotiva podem ser vantajosas.
Caíque ressalta que o preço do fluido refrigerante no mercado subiu bastante, o que também pode influenciar na decisão pela aquisição do equipamento. “Com a máquina, o gás que está dentro do veículo é recolhido, e não perdido. Desta maneira, o procedimento se torna mais econômico, porque o gás é reaproveitado, mais ecológico, porque esse gás causa problemas à atmosfera, e também mais profissional”, declarou o inspetor técnico da Mahle, fabricante que comercializa a linha de equipamentos ArcticPRO no mercado brasileiro.
Outro ponto que deve ser observado é a perspectiva da mudança de tecnologias já pintando no horizonte. Caíque aconselha que o gestor da oficina, uma vez decidido pelo investimento, opte por uma máquina recicladora que permita fazer a futura conversão do R134a para o novo fluido R1234yf e seu óleo de lubrificação de sistema correspondente, o POE.
“Algumas das nossas máquinas já estão aptas para que a gente possa fazer uma simples conversão quando houver a necessidade. Ou seja, ao invés de comprar uma máquina nova, o mecânico adquire um kit para fazer um retrofit interno da máquina. Aí ela vai deixar de utilizar o R134a para trabalhar com R1234yf”, afirma Caíque. “Para esse gás novo, inclusive, é muito recomendável utilizar a máquina recicladora justamente por ele ser um gás inflamável e perigoso. Tem que se tomar um pouco mais de cuidado no manuseio. Por isso, sim, vale o investimento na máquina, além do profissionalismo que ela agrega à oficina”, conclui.
COMO IDENTIFICAR OS ENGATES DO CIRCUITO DE AR-CONDICIONADO
Obs: Em alguns veículos, pode haver diferença entre as conexões quando comparadas a este padrão.
QUANTIDADE CORRETA DE FLUIDO É DETERMINANTE
Somente com uma máquina recicladora é possível repor com precisão a quantidade exata de fluido refrigerante que o sistema de climatização de cada veículo requer. Graças ao gerenciamento eletrônico do equipamento, máquinas atuais podem ser utilizadas não só nos automóveis mais modernos que estão em linha como, também em veículos com sistema de climatização “fora do padrão”. Em casos de veículos que possuem apenas uma linha de serviço como, por exemplo, a picape Chevrolet S10 com motor MWM e o Renault Megane, basta configurar a máquina com o modelo correto que o equipamento já entende como proceder especificamente com aquele veículo.
A aplicação de gás em falta ou em excesso pode trazer problemas ao funcionamento do sistema. Com a falta, o que ocorre é a queda de eficiência do sistema, que não conseguirá retirar calor suficiente da cabine do automóvel. Já a inserção de fluido em excesso pode causar o congelamento da linha e problemas ao compressor do sistema, que entra em uma espécie de “ciclo vicioso” que também não permite ao ar-condicionado trabalhar corretamente para remover calor do habitáculo.
“Uma quantidade excessiva de fluido refrigerante faz com que a válvula-torre do compressor acione e desligue constantemente o acoplamento da embreagem do sistema”, comenta Caíque. “O termostato identifica um pico muito rápido de congelamento no sistema e desacopla a embreagem para tirar o ar-condicionado de funcionamento. Porém, o habitáculo do veículo ainda não está resfriado. Então o termostato aciona novamente o compressor, o que leva a um novo congelamento e ao desligamento do compressor novamente, sem atingir a temperatura desejada no habitáculo”, aponta o inspetor técnico da Mahle.
Entretanto, o congelamento da linha também pode ser uma consequência natural do procedimento mesmo quando feito corretamente. “A linha de baixa pressão condensa a umidade ou pode até congelar devido à diferença de temperatura da tubulação com o ar externo. O fluido refrigerante tem a função de roubar calor do sistema e, por isso, a diferença entre as temperaturas interna e externa pode provocar o congelamento”, explica o inspetor técnico da Mahle.
Por esse motivo, ter uma máquina que diz ao operador precisamente a quantidade de gás que injetou é importante para entender se o congelamento ou se o próprio funcionamento do sistema é indício de problema ou não.
PARA QUE SERVE O ÓLEO PAG?
Além do fluido refrigerante, também existe um óleo lubrificante do sistema circulando na tubulação. Caíque, da Mahle, explica que esse óleo sintético tem duas propriedades. A primeira é dentro do compressor, lubrificando as palhetas. A segunda é trabalhar junto com o fluido refrigerante para lubrificar as conexões evitando, assim, o ressecamento de peças como os o’rings e válvula de expansão. “Se não houver algo que lubrifique essas conexões, o fluido refrigerante vai acabar ressecando essas borrachas e conexões, provocando futuros pontos de vazamentos de fluido”, explica Caíque.
O especialista da Mahle explica que os óleos podem diferir na viscosidade (PAG 46, PAG 100, PAG 150 etc., onde o número é o indicativo da resistência ao escoamento) e no tipo (pode ser encontrado em híbridos e elétricos o óleo POE, que não conduz eletricidade). Mas, assim como o fluido refrigerante, existe uma quantidade correta de óleo para cada sistema. Enquanto a falta de lubrificação provoca o ressecamento das conexões, o excesso pode provocar uma espécie de calço hidráulico no sistema, dificultando a circulação do fluido refrigerante e prejudicando o funcionamento do sistema.
E assim como lubrificantes de outros sistemas do veículo, o óleo da climatização possui vida útil e sua troca é recomendada mediante tempo preconizado no manual de reparo. “Com o tempo, a propriedade do óleo vai se perdendo e, por isso, recomendamos a inspeção do sistema de ar-condicionado uma vez ao ano”, diz Caíque. Um óleo com coloração alterada indica desgaste do sistema e necessidade de reparo. Vale lembrar que o óleo removido pela máquina recicladora é o que circula na tubulação do sistema junto com o fluido refrigerante. O que fica contido no interior do compressor não é removido, pois, seu mecanismo é lacrado.
Outro elemento passível de manutenção preventiva no sistema e que colabora com a vida útil do compressor é o filtro secador do condensador. Esse filtro tem como função reter as impurezas geradas pelo desgaste natural do sistema, principalmente, do compressor, além de reter partículas de umidade no interior do sistema. Se o filtro ficar saturado, a sujeira não ficará retida e circulará pelo circuito, o que, em casos mais graves, vai danificar o compressor. Caso não haja outra referência preconizada em manual, estabeleça como boa prática inspeções anuais do sistema como um todo e a troca preventiva de 2 em 2 anos.
IMPORTÂNCIA DO VÁCUO E DA PERFEITA VEDAÇÃO DO SISTEMA
Uma das funções mais importantes da máquina recicladora na manutenção do ar-condicionado é o vácuo. É um procedimento moroso e, por vezes, demorado. Mas é fundamental não só para o funcionamento correto do sistema como, também, para evitar a corrosão de peças como o compressor pelo acúmulo de umidade.
O vácuo sempre deve ser aplicado após qualquer intervenção feita no circuito – seja preventiva ou corretiva – antes da reinserção do fluido refrigerante e do óleo lubrificante. “O vácuo serve para tirar toda a umidade que está dentro da tubulação do sistema de climatização. Essa umidade é a condensação proveniente da troca de calor com o meio externo e diminui a eficiência do ar-condicionado”, explica o instrutor técnico da Mahle, acrescentando que o procedimento de vácuo também identifica possíveis fugas do sistema.
Segundo Caíque Barbosa, o mínimo de tempo para o vácuo é de 20 minutos em um carro pequeno, dependendo da capacidade de vácuo da bomba da máquina que está sendo utilizada. Outros fabricantes podem recomendar mais tempo pelas características específicas de cada equipamento. “Não basta apenas observar os manômetros descendo para a pressão negativa e considerar o que o vácuo foi feito. Se o tempo de aplicação de vácuo for muito curto, não dá para garantir que a umidade do sistema foi retirada. No momento em que o fluido for reinserido no sistema, a umidade que ainda está lá vai impactar na eficiência do funcionamento”, adverte o especialista da Mahle.
Um vácuo perfeito, claro, depende da condição das conexões. “Sempre verifique muito bem todos os tipos de o’rings, válvulas e conexões. Principalmente a válvula de expansão, que é um dos locais onde há a maior concentração de vazamentos”, afirma Caíque. Uma boa prática na manutenção é, quando removidos os componentes com vedação, trocar os o’rings e lubrificá-los com óleo PAG antes de os reinstalar no veículo.
Todos esses passos são apenas as linhas gerais que regem a boa manutenção do sistema de ar condicionado em um veículo. Evite processos de tentativa e erro e pular etapas, ou o resultado final será comprometido. Ter as ferramentas adequadas é obrigatório, e a máquina recicladora é parte fundamental de todo o procedimento.
Mais informações – Mahle: 0000-0000
Texto & fotos: Fernando Lalli